13 de março de 2009

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Excomungados
Por: Isaac Rehl

O Fato

No dia 25 de fevereiro de 2009, uma menina de nove anos de idade, reclamando de tontura e enjôos, foi atendida no hospital municipal de sua cidade, Pesqueira (PE) -- ali foi constatada uma gravidez de gêmeos. No dia 27, o padrasto da menina, 23 anos, foi preso por suspeita de estupro -- crime que ele confessaria, acrescentando também violentar a irmã da menina, de 14 anos e com deficiências física e mental.

A parte policial do caso estava resolvida: detectado o crime, o criminoso preso. No entanto, havia uma criança de nove anos esperando gêmeos – o que fazer? Segundo a legislação brasileira, há dois casos em que o aborto é permitido: a) em caso de estupro; b) em caso de gravidez de risco. A menina se encaixava em ambas as situações previstas, e dia 4 de março de 2009 o aborto foi realizado com o consentimento da mãe e sob a égide da lei.

Entra em cena então uma persona non grata na história: a Santa Madre Igreja, através da figura do arcebispo de Olinda e Recife, Dom José Cardoso Sobrinho, o qual anunciava a excomunhão de, excetuando-se a menina, todos os envolvidos no aborto: a mãe, a equipe médica, o diretor do hospital e membros de ONGs que apoiaram o ato (para ser excomungada, a menina teria que ser maior de idade). Cria-se então uma polêmica (embora de pequenas proporções, se comparada ao caso de Isabela, a menina jogada de um prédio, ou ainda de Eloá, a adolescente morta pelo namorado) em que as discussões são desviadas para questões de pouca relevância, enquanto uma questão fundamental permanece intocada: que papel a doutrina católica tem ainda a desempenhar em nossa sociedade?

Os debates

Todavia, o debate conduzido pelos maiores meios de comunicação aponta em outra direção, a questão principal em pauta tornou-se saber quem tinha razão, o arcebispo ou os médicos. Então, vem à cena feministas de todos os lados e movimentos pró e contra aborto; acusações contra a Igreja são cuspidas e reiteradas e os chamados conservadores põem-se a falar da degradação dos valores e da podridão da sociedade.

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, segundo o jornal Folha de São Paulo, acusa a posição da igreja de “extrema, radical e inadequada”, acrescentando que lhe parece um “contrassenso diante do que aconteceu”. Postura semelhante mostrou o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, no mesmo jornal, afirmando ser a reação da igreja retórica e sem respaldo no judiciário. O próprio presidente, em mais uma de suas frases de fino raciocínio magnificamente construídas, disse:

Não é possível permitir que uma menina estuprada pelo padrasto tenha esse filho. Até porque a menina corria risco de morte. Nesse aspecto, a medicina está mais correta que a igreja.
Valéria Melk, líder feminista do movimento Católicas pelo Direito de Decidir, falou ao jornal O DIA, afirmando que a decisão da igreja foi cruel e violenta.

Já o colunista Carlos Ramalhete, da Gazeta do Povo, filósofo católico escreve em defesa da igreja, contra o aborto e em resposta aos movimentos feministas:

São saudados como heróis salvadores os carniceiros que arrancaram do ventre da mãe duas crianças perfeitamente saudáveis e atiraram os cadáveres em uma cesta de lixo [...] A vida, em si, para os defensores do aborto, não vale nada. Ao invés dela, o que teria valor seria o resultado final de uma equação que tem como componentes o bem-estar da pessoa e sua utilidade para a sociedade.
O que se vê, de fato, é o caso se transformando em uma arena pela hegemonia de um discurso. Cada lado, argumentando estar em defesa da vida, ataca o outro de não possuir ética, não se importar com os seres humanos. Mas há alguns aspectos mais objetivos que podem ser considerados, em relação às questões de direito que envolvem o caso.
(Continua)

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