25 de março de 2011

Entrevista

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O poeta, crítico literário e tradutor Cláudio Willer se encontra em São Luís desde o último domingo, ministrando Oficina de Poesia e Surrealismo, no Palácio Cristo Rei, sede da Reitoria da Universidade Federal do Maranhão – UFMA. O poeta maranhense Paulo Melo Sousa fez a entrevista abaixo com o escritor paulista que, hoje à noite, 24 de março, participa do Papoético, evento articulado em São Luís pelo próprio Paulo Melo Sousa, e que completa quatro meses de atividade justamente com a presença de Cláudio Willer.

Paulo Melo Sousa - No mundo contemporâneo, com verniz cibernético, muitos continuam afirmando que 'a poesia é ofício de mortos'. Qual o lugar da poesia nos dias de hoje?

Cláudio Willer - Poesia é minoritária, a “outra voz”, como disse Octavio Paz, faz tempo. Com certeza desde o tempo de Baudelaire, que sempre deixou bem claro que estava fora do mercado e que sabia disso. Mallarmé também insistia, muito ironicamente, que sua poesia não era “metalurgia”, nem “comércio”. Ao mesmo tempo – e a menção a Baudelaire e Mallarmé é proposital – poesia tem essa durabilidade, essa capacidade de exercer influência, formando novos escritores e leitores, e principalmente formando consciência, percepção da realidade. Quanto ao mundo digital, poesia se dá muito bem com ele: beneficia-se dos novos meios e espaços para exposição e divulgação. Afinal, estamos trocando idéias por e-mail, e o resultado dessa troca de ideias certamente aparecerá em páginas de internet e blogs.

PMS - O uso do ciberespaço estaria provocando, como afirmam alguns, a criação de uma nova ‘forma’ de expressão poética?

CW - Não, o erro dos concretos foi justamente esse, de acharem que a adoção do meio digital acarretaria a expressão por ideogramas. O que se vê no ciberpespaço é o mesmo que vinha sobre o papel, ressalvada a renovação natural ao longo do tempo. Cabe lembrar que artistas são precursores – não caminham a reboque de tecnologias. Nas vanguardas do século XX e especialmente no surrealismo, é possível apontar antecipações dos meios e suportes que ainda viriam.

PMS - Muitos escritores, atualmente, criticam a contribuição da poesia concreta à Literatura. Qual a sua posição sobre tal assunto?

CW - Existe, é inegável, uma contribuição da poesia concreta, sob forma de informação e de obras literárias, algumas delas de efetivo valor. E também a disseminação de equívocos, por exemplo, com relação às consequências da revolução tecnológica para a criação literária e artística. A releitura dos manifestos concretistas mostrará que erraram redondamente nas previsões do que a informatização acarretaria. Principalmente, há uma defesa de uma criação mais cerebral, do que tenho chamado de cartesianismo poético, tendendo a uma burocratização da criação, a uma dissociação de poesia e vida – é nesse nível que surrealismo e formalismos dos quais a poesia concreta é um exemplo se opõem frontalmente.

PMS - Sua poesia possui uma viva raiz surrealista. Como essa vertente estética começou a visitar a sua produção poética?

CW - Por alguma misteriosa afinidade. Encantei-me ao ler autores como Breton, Desnos, Eluard. Mas não se trata apenas de escolha de uma ‘vertente estética’. Ao falarmos de surrealismo, estamos falando de rebelião, recusa da ordem estabelecida, inconformismo; de uma atitude; de uma visão de mundo. E, evidentemente, de uma contribuição cultural, no sentido mais amplo da palavra, incluindo todos os campos do conhecimento e a relação do indivíduo com o mundo. Surrealismo é, entre outras cosias, retomada de uma rebelião romântica, atualizando-a. Uma tentativa de síntese da subjetividade e do mundo objetivo. Aprofundaremos a discussão desses tópicos durante o curso /oficina que darei em São Luís.

PMS - Após o surrealismo, algum outro movimento mais recente garimpou nesse mesmo veio, que tenta unir o subjetivo ao objetivo?

CW - Em primeiro lugar, surrealismo não é apenas vanguarda histórica. Prosseguiu. Há, por exemplo, o importantíssimo movimento surrealista português, a partir de 1950; surrealismos ibero-americanos; um movimento surrealista norte-americano a partir de 1963, etc. Agora mesmo recebi e-mail do surrealista canadense Gaston Lemerre, anunciando uma nova publicação, e um poema do surrealista brasileiro Floriano Martins. Surrealismo atravessa todo o século XX, o que não ocorreu com os demais movimentos vanguardistas. À parte isso, tenho observado a mesma tentativa de superação da dualidade sujeito-objeto em Jack Kerouac e outros autores da geração beat. E, é claro, a verdadeira poesia quer sempre projetar-se no real, superando as dicotomias.

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